segunda-feira, 17 de maio de 2010

O Bardo - Capítulo 4


Capítulo 4 - O calor de um abraço

Dois vultos caminhavam à sombra de uma mata densa, vagamente iluminados por uma lua cheia no céu. Um deles ia à frente, procurando rastros no solo. O outro caminhava mais atrás, com certa lentidão, imerso em seus pensamentos.

-James, ande. Mais um pouco e chegaremos à borda Oeste da floresta, e estaremos de frente para a planície. Dali até a montanha Heller são mais três dias de caminhada. Preciso de você atento.

O jovem apressou o passo, aproximando-se mais de sua instrutora. Sentia-se oprimido pela escuridão ao redor, e pela ausência de ruídos. Silêncio. Como se tudo ao redor o observasse, numa tocaia sem final. Seu punho tocou, por instinto, o cabo do sabre, à cintura. Lembrou-se da luz que exalara, em seu último treino, e teve vontade de acendê-lo novamente, apenas para iluminar o caminho.

-Meu pai está na montanha?

A mulher olhou-o na noite. Seus olhos prateados refletindo o luar. Encarou-o por alguns segundos, antes de voltar sua atenção à frente novamente.

-Sim, está. Desde que começamos a ser caçados, nós Tocados nos exilamos em diversos pontos do continente. Rester subiu a montanha nunca antes escalada pelos humanos. Lá ele ergueu um templo de pedra e se isolou.

James continuou caminhando pouco atrás de sua mestra. A cabeça ainda fervilhando com perguntas.

-Mas, se ele se isolou lá em cima... como ele é meu pai?

A mulher esboçou um leve sorriso sob seu capuz. Caminhou mais alguns metros em silêncio, até decidir que aquele lugar era um bom sítio para dormirem aquela noite. Parou, verificando uma pequena clareira, com a base circundada por árvores espaçadas, mas com o topo coberto por suas copas.

-Sente-se e se ajeite. Passaremos a noite aqui.

Um pouco à contragosto, por não ter obtido resposta, James sentou-se, encostando-se à uma bétula e se enrolando em sua capa de viagem, já bastante esfarrapada. Deixou o sabre encostado em seu peito, à postos. A mulher deitou-se de costas na grama, à vontade. Na cintura, ainda mantinha a bainha com o coto de sabre guardado.

-Uns quinze anos atrás, Rester desceu a montanha. Ele teve uma visão, é o que diz. Viu uma mulher muito bonita, sentada em uma sala igualmente bonita, lendo um livro. Ela estava grávida, e ele soube em sua visão que seria seu filho.

James encarou o chão por um tempo antes de levantar a voz novamente.

-Então... eu sou o resultado de uma visão... os Tocados são capazes de prever o futuro?

-Algumas vezes, criança, conseguimos ter vislumbres de possibilidades da linha do tempo. O Seishin, como eu já lhe disse, cerca a todos e é uno com todos. Alguns de nós, mais talentosos, conseguem "ler" essas flutuações no Seishin coletivo, percebendo e calculando as possibilidades e probabilidades. Rester viu o que viu, e buscou sua visão. Você é o resultado disso.

O rapaz manteve-se novamente calado por mais algum tempo. Uma dúvida remoendo dentro de si, tomando forma. Abraçou seus joelhos, aquecendo-se melhor. Mantinha seu olhar fixo em uma pequena pedra, coberta por mato. Não pôde mais se conter.

-Por que? Por que ele não me criou? Por que fugiu de volta pra sua montanha, e me deixou ser tratado como aberração... me deixou viver isolado...

A mulher sentou-se, de frente para o garoto, e abraçou-o. James, pego de surpresa, corou. Era a primeira vez que sua mestra demonstrava afeto. Seu abraço era caloroso e acolhedor. Um abraço de mãe deve ser assim, pensou o rapaz. Pôde ouvir o coração dela batendo, ritmado.

-Ah, meu querido. Rester não queria se separar de você, mas era preciso. Vocês dois teriam sido mortos, ou pior. Ele subiu para a montanha, resignado, e me mandou cuidar de você. E eu fui, com felicidade. A vida dele e a sua são muito importantes.

O garoto estava confuso. Muita informação para um dia só. Sentia-se acolhido e abandonado, resgatado e perdido. Sem notar, algumas lágrimas rolaram de seus olhos. O primeiro abraço de sua vida, de uma figura maternal. Era gostoso, não queria que acabasse.

Ali ficaram por vários minutos, até que James adormeceu. A mulher deitou-o carinhosamente na grama, e pôs-se à vigiar ao redor. Aquela criança era muito importante, pensou, e o futuro de muitos dependeria dele. Tão jovem. Uma pena. Às vezes o destino é ingrato.

Mas é o destino.

Na manhã seguinte, chegaram finalmente à grande planície, e puderam ver, ao longe, a montanha de Heller, como uma gigantesca presa brotando no meio da tundra. James observou o colosso antes de dizer, em voz baixa.

-Pai, eu estou chegando.

Continua...

4 comentários:

Rodolfo disse...

@Lorena- Sim, sim, aumentar a letra é um projeto. Esse capítulo foi meio corrido, e a semana meio conturbada (na busca de um novo layout), por isso as alterações na fonte ainda não foram feitas. Mas, no próximo post... rsrs
Obrigado pelo apoio!!

Marcus disse...

Bom como sempre...
concordo com a Lorena com relação a letra...
abraço leq

Sayu disse...

aposto que o rester é bonitão, lalalá~

tainara elektra disse...

como sempre muuuuito bom os capítulos ótimas as sequências ...ansiosa para o próximo.
bjão
=)

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